Há exatas três décadas, Santa Catarina enfrentava um dos capítulos mais dolorosos de sua história climática. A chamada “Enchente de Natal”, iniciada em 23 de dezembro de 1995, deixou um rastro de destruição que marcou gerações. O desastre afetou 50 municípios, deixou mais de 28 mil desabrigados e tirou a vida de 29 pessoas, concentrando sua fúria na região Sul do estado, especialmente em Timbé do Sul, Jacinto Machado, Forquilhinha e Siderópolis.
Hoje, sobreviventes e equipes de resgate revisitam as memórias daquela noite de escuridão e lama, traçando um paralelo com a evolução da resposta a desastres no estado.
“A água levou a casa rio abaixo”
Entre os relatos mais impactantes está o de Anderson Rufino Vieira, hoje com 41 anos. Na época com 11, ele estava na casa da avó, no costão da serra, para celebrar o Natal. A festa transformou-se em pesadelo quando uma cabeça d’água atingiu a residência.
“Nós tentamos sair (…), mas a água já tinha tomado conta. Voltamos para casa e começamos a rezar todos juntos. Foi quando veio uma bomba d’água e levou a casa rio abaixo.”
Anderson foi arrastado por 800 metros e sobreviveu agarrado a uma árvore. Ele perdeu 11 familiares naquela noite, entre avós, tios e tias. Só foi resgatado por um helicóptero uma semana depois.
O resgate na escuridão
Para o Corpo de Bombeiros Militar (CBMSC), a operação foi um divisor de águas. O coronel da Reserva, Vanderlei Vanderlino Vidal, lembra que o quartel de Araranguá havia sido inaugurado apenas dois dias antes. Sem equipamentos adequados para a magnitude do evento, a coragem foi o principal recurso.
“O cenário era de escuridão total (…) enfrentamos água e lama até a altura do pescoço”, relata Vidal. Em meio ao caos, fome e cansaço, a humanidade prevaleceu. O comandante recorda com emoção o momento em que dois soldados, cobertos de lama, lhe desejaram “Feliz Natal” durante as buscas.
Evolução: do improviso à tecnologia
Há 30 anos, os bombeiros contavam com pouco mais que a própria farda e alimentavam-se de pão e leite, quando disponíveis. Hoje, o cenário é outro. O tenente-coronel Henrique Piovezam da Silveira destaca que o CBMSC possui drones, lanchas, jet skis e equipes de Força-Tarefa especializadas em cada batalhão, prontas para agir com autonomia.
Além da estrutura, a ciência avançou. Na época, a previsão do tempo era incipiente e muitos dados eram manuais. Atualmente, a parceria entre Defesa Civil e órgãos de meteorologia permite monitoramento constante e alertas antecipados.
Cicatrizes na geografia
A força das águas foi tamanha que alterou a geografia local. Em Timbé do Sul, o Poço do Violão, hoje ponto turístico, surgiu após o rio mudar de curso e represamentos sucessivos romperem barreiras naturais.
Na comunidade da Figueira Bordignon, um memorial em frente à Igreja São Pedro eterniza os nomes das 16 vítimas da cidade com a frase: “A água levou… a lembrança ficou”.












