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Crônica | A bailarina desvairada | Llantada

A bailarina desvairada

Conheces a casa onde moras? Será que a conheces? Não estou falando do teu lar, esse ambiente aconchegante que criaste para conviver em harmonia com a tua família. Nem da tua cidade, do teu estado ou do teu país. Refiro-me ao planeta Terra. Para nós, bichinhos tão pequenos, o “planetinha”, como carinhosamente a chamamos, é enorme. Pensa sobre a dificuldade que temos para nos deslocarmos nela. Usamos o automóvel para chegarmos mais rápido e, na ânsia de consegui-lo, às vezes, nos arrebentamos pelo caminho.

                   Quando a distância é muito grande, recorremos aos aviões. Aí então são horas e horas sentadinhos numa poltrona quê, no início, é confortável mas com o decorrer do tempo já não sabemos em que posição ficar, tamanho o desconforto. E quando enfim chegamos, ficamos maravilhados por termos ido tão longe em tão pouco tempo. Isso só no plano horizontal. Fantástico!

                   Se tentarmos ir pra baixo, para o centro da Terra, constataremos que é impossível irmos longe. Não pela distância em si, mas pela impossibilidade física. Mesmo usando a tecnologia mais sofisticada, se cavarmos um buraco, não poderemos avançar muito, porque a sobrevivência humana se torna impossível, dada a inexistência de oxigênio e a resistência da matéria. É que, dali pra baixo, é só matéria pastosa (magma) ou líquida incandescentes. Tudo é fogo. Por isso é que algumas religiões dizem que o Inferno é lá embaixo. Só rindo mesmo.

                   A superfície da Terra é lindíssima. Olha as matas, montanhas, rios, lagos e mares. Observa a beleza dos locais cobertos pelo verde da vegetação, pela neve ou pelos áridos desertos, tudo isso iluminado pela luz do Sol ou da Lua. Mira as estrelas no Céu, cintilantes. Tanta beleza me comove às lágrimas. E aí eu quero saber quem sou e porque estou aqui. Perguntei aos meus pais, aos mestres, aos sacerdotes de todas as religiões e aos cientistas. Ninguém me respondeu coerentemente, porque não sabem. Desesperado, recorri aos deuses, mas eles também não me respondem. Apenas riem de mim. Mentes imaginativas inventam explicações fantasiosas. Não me satisfaço. Eu quero saber.

                   Na falta de respostas inteligentes e coerentes, eu vejo alegre e esperançoso o homem, este espírito inquieto, indo à luta. Criou uma sonda espacial que está bisbilhotando o infinito do Cosmos, a Voyager I. Lançada em 1977, três anos depois, quando ela estava a cerca de seis bilhões de quilômetros da Terra, os cientistas fizeram-na voltar-se para tirar uma fotografia nossa. Sabes o quê se viu? Um pontinho insignificante, quase indistinguível em meio a uma miríade de astros e estrelas. Apenas uma manchinha azul-claro. Uma manchinha que arrodeia diariamente em torno de si na velocidade de 1.666 km/hora e dá uma volta por ano em torno do Sol na velocidade vertiginosa de 107.244 km/h, tal qual uma bailarina desvairada. E eu e tu grudados nela.

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