Eu queria te conhecer
Hoje eu acordei com uma vontade imensa de escrever algo que te agradasse. Uma coisa que te fizesse feliz e te devolvesse todas as alegrias da tua infância. Mas como fazê-lo, se eu não te conheço? Hás de me retrucar, com espanto: – “Como não me conheces, se há tanto tempo leio as tuas crônicas, e comento?” Bem, o que eu quis dizer é que não conheço a verdadeira pessoa que és. A que eu conheço é esta que tu exteriorizas.
Eu não quero falar com esta que aparentas ser. Ocorre que eu, tu e todos ocupamos um corpo físico que tem uma aparência. Mas esta não quer dizer nada. Nós somos o que pensamos. Nem mesmo o que falamos, o que fazemos ou deixamos de fazer mostra a verdadeira pessoa que cada um de nós é. A sociedade, os preconceitos, as convenções, os costumes, as leis, as religiões e os tabus nos obrigam a demonstrar e a ter um tipo de comportamento padrão, de acordo com a cultura e o momento em que vivemos. Assim, todos nós nos violentamos, eis que perdemos a nossa essência. Eu não estou dizendo que isso está errado, porque a vida em sociedade exige que haja limites de conduta e de expressão de pensamentos.
Sempre que estamos com uma ou mais pessoas nós demonstramos não o que somos realmente, mas aquilo que querem que sejamos. É como se estivéssemos usando máscaras. Nao! Não sejas hipócrita contigo mesmo, a ponto de mentir-te: – “Eu não sou assim”. Ora, não queiras ser melhor do que ninguém, pois isto é muito feio. Pensa: quantas vezes já te deu vontade de fazer ou dizer alguma coisa, e não o fizeste? Hein? É isto que eu estou te querendo dizer, mas a minha inteligência limitada me dificulta expressar.
Lembra-te, quantas ocasiões já te indagaram: “Por que estás tão quieto? Por que estás tão triste? Por que estás rindo, chorando ou falando sozinho? E a tua resposta foi simplesmente: “Por nada”, “coisa minha”, “não liga”, “me deixa”. Diga-me, com honestidade, por qual razão não respondeste o que sentias naquele momento? Se não tens coragem de responder, eu o faço por ti. Porque, se dissesses, o teu interlocutor descobriria quem realmente és. Todos somos assim. Menos os loucos, os bêbados, os poetas e as crianças. Estes sempre são autênticos.
É por isso, só por isso, que esta minha singela crônica de hoje ficou tão vazia, porque as coisas bonitas que eu queria te dizer, e não encontrei, foi porque não te conheço bem. Não consegui criar e escrever aquilo que hoje gostarias e tanto precisavas ler. Mas, não te preocupes, porque eu também fiquei perdido num imenso vazio. Sabes por quê? Porque eu também não me conheço. Se não acho as palavras certas para mim, como as acharia para ti? Voltemos, então, ao âmago dos nossos pensamentos mais íntimos.