Trégua de Natal
Na Primeira Guerra Mundial (1914/1918), aconteceu um movimento espontâneo de paz e confraternização em comemoração ao Natal. A ideia não partiu dos governos ou dos comandos dos exércitos envolvidos. Não. Nada disso. Foi única e exclusivamente o espírito natalino que envolveu alguns soldados inimigos (ingleses e alemães), em pleno front.
A I Guerra Mundial foi considerada como a última entre “cavalheiros”, porque os combates aconteciam fora das cidades. Um país declarava guerra a outro e ambos se digladiavam em campo de batalha. Quando os exércitos se encontravam, estacionavam a certa distância um do outro e cavavam trincheiras para se abrigarem. Entre elas ficava um espaço vazio onde ocorriam os combates. A arma mais usada era a baioneta. Este espaço que dividia as trincheiras era denominado “Terra de Ninguém”. Antes dos soldados saírem das trincheiras para se matarem, elas eram intensamente bombardeadas pela artilharia inimiga com uma “chuva de aço”.
Os homens passavam meses nessas condições, com raros dias de folga, que sempre havia, para visitarem suas famílias. Banhos não havia. As necessidades fisiológicas eram feitas próximas às trincheiras ou dentro delas. Era perigoso ou impossível se afastarem. Chuvas intensas transformavam tudo num lodaçal. Mais a neve de invernos rigorosos. Cadáveres se acumulavam na terra de ninguém, pois era impossível recolhê-los, sob pena de se tornar alvo fácil para o inimigo. Comida e água às vezes tardavam a chegar. Viviam sob o domínio do medo, da dor, da fome, da sede, do frio e do fedor insuportável de fezes e de cadáveres em putrefação.
Natal de 1914, primeiro ano da Guerra, em Ypres, Bélgica, alguns soldados fizeram uma trégua espontânea. Pararam a luta e começaram a cantar. No início cada exército em seu idioma e, após, ambos num coro de línguas misturadas, que causava risadas entre eles. Confraternizaram trocando comidas, bebidas e cigarros. Até uma partida de futebol na neve, improvisada, aconteceu. Isso revoltou os governos e comandos dos exércitos envolvidos, que os ordenaram voltar imediatamente à luta.
E nós aqui neste Brasil maravilhoso, hein? Em pleno verão e em paz com as outras nações, mas muitos irmãos nossos em conflitos com eles mesmos. Guerras da criminalidade, no trânsito, entre vizinhos, dentro das famílias e mais as picuinhas da política. Será que não daria para fazermos pelo menos uma Trégua de Natal? Respeitarmo-nos e perdoarmo-nos mais? Não cometermos excessos. Não nos agredirmos dentro dos lares, nos bares e nas ruas. Pelo menos nesses dias sagrados? Se aqueles soldados o fizeram num clima e ambiente hostil, num verdadeiro Inferno, não poderíamos nós ao menos tentar uma trégua aqui neste Paraíso?