Isolamento social não pode ser sinônimo de abandono

Desde o início dos decretos de isolamento, temos acompanhado através das redes sociais, inúmeros comentários sobre idosos que desobedecem a determinação e vão “se aglomerar”, em vários lugares. “Não sabem o risco que correm?”, diz uma postagem. Algumas chegam a ser grosseiras e agressivas. Porém, muitas vezes, o medo da possibilidade de contrair o vírus e maior que o da solidão iminente.
Segundo o clínico geral e cardiologista Rhuan Castelo “temos preconizado distanciamento. Pacientes cardiopatas, por natureza, já são pacientes mais ansiosos e deprimidos”. Esses pacientes, além de tratar o coração, tratam condições psicológicas.
“Quando você pensa num jovem, é mais fácil. Habitualmente são mais familiarizados com as novas tecnologias e utilizam essas ferramentas para dar aquela driblada no distanciamento. Mas para o idoso, isso tende a ser mais complicado e pode agravar qualquer quadro depressivo”, diz Castelo.
Para ele, “obviamente, por conta dessa pandemia, não vai poder ir todo mundo na casa dele, mas é bom que se faça um revezamento, uma vez por semana vá alguém, manda mensagens, videochamadas, mesmo que ele não tenha muita habilidade com a tecnologia, vai perceber o quanto é amado, o quanto é bem quisto”, reforça.
O cardiologista reforça que esse “abandono”, pode acarretar a piora de quadros clínicos como cardiopatias, câncer, podendo descompensar um diabetes, o agravar um quadro de hipertensão. “É muito importante tratar a mente desse paciente que já é de alto risco e não recebe mais a visita de ninguém”, conclui.
Parece interessante nos questionarmos: Se a mortalidade fosse maior entre crianças e adultos jovens, estaríamos nos comportando diferente? Esses valores que associam a juventude, a produtividade, a beleza e o amor somente às pessoas que não são velhas estão enraizados na nossa cultura. No Brasil esse tipo de discurso é muito forte. A única forma de as pessoas mudarem é pensar que ou já são velhas hoje, ou serão amanhã. Estão falando delas também, de como serão tratadas quando ficarem velhas. O que está em jogo agora são valores a respeito do significado da vida. Eles não são velhinhos descartáveis.